sábado, 23 de outubro de 2010


Hoje mais cedo, um pouco antes de começar a redigir esse post, chequei pela última vez o e-mail criado para receber as fotos que eu havia encomendado para vocês, alguns dias atrás. Até o presente momento foram 153 mensagens, muitas delas contendo não só instantâneos tirados no final de semana passado, mas também histórias, casos curiosos, pedidos, declarações e até agradecimentos.

Devo dizer que não foi tarefa fácil selecionar as imagens – as poucas que deverão cumprir a função de representar quatro memoráveis noites – , sobretudo se considerarmos a infinidade de pontos de vista que podem haver destes eventos, presenciados por dezenas de milhares de pessoas.

Se algumas fotos pecavam pela qualidade do registro, destacavam-se pela força do momento retratado, e por aí pode-se imaginar a saia justa que foi escolhe-las. Aos que não tiveram as imagens selecionadas, agradeço imensamente, e peço que compreendam as limitações do critério adotado. Ressalvas feitas, vamos aos shows:

Durante a passagem de som no CECON, foi impossível não recordar de abril de 1999, quando tocamos pela primeira vez naquele lugar e em Recife, participando do Abril Pro Rock. A produção amadora de fitas demo na casa da Ladeira da Misericórdia, emprestada por um sujeito da faculdade que mal conhecíamos, os encartes recortados e grampeados um a um (sem esquecer de pintar com hidrocor vermelho as rosas que a figura feminina segurava). Não por coincidência, foi lá que surgiu “A Flor”.

A mala pesada, recheada de cassetes, a dúvida se havíamos levado demais ou de menos, o palco mais profissional em que havíamos pisado até então. As roupas quentes do figurino de época (de quem terá sido essa bendita ideia?), a roda de pogo que só existe em Pernambuco, todas as demos vendidas após o show.

Mala vazia de volta, críticas positivas nos jornais e, em duas semanas, veio o contrato com a gravadora. Incontáveis passagens pela cidade depois, lá estavam 16 mil pessoas só para nos ver, possivelmente mais gente do que a soma de todos os dias de festival da edição de 11 anos atrás. Este mar de gente que se apertou, cantou e dançou nos brindou não só com o maior público em eventos fechados de nossa carreira, como também com um dos melhores shows que já fizemos na vida. O que mais posso dizer?

No dia seguinte estávamos, mais uma vez, no Ceará Music. Lembrei-me de nossa estreia acanhada no pátio do Marina Park Hotel, lá pros idos de 2002. Tocaríamos no palco menor, que ainda assim era uma conquista importantíssima na época em que divulgávamos o Bloco, quando todo mundo pensava que a banda havia acabado após o estrondoso sucesso de Anna Júlia. A organização do evento, com uma pulga enorme atrás da orelha, resolveu dar uma chance à banda esquisita, e de repente lá estávamos nós, em outubro de 2010, como uma das principais atrações da noite.

Foi um lindo show em Fortaleza, com chuva de papéis picados, serpentinas em “Todo Carnaval Tem Seu Fim” e mãozinhas pro alto até depois de onde a vista alcançava. Na plateia, bandeiras e faixas de diversos pontos do norte e nordeste do país, gente que saiu de muito longe, de ônibus até, e que ficou lá, em frente ao palco guardando seu posto, desde muito antes do sol se por. À vocês, muito obrigado por tamanha consideração!

Após outra noite inesquecível, porém muito mal dormida, e do carinho de alguns fãs no aeroporto, chegamos a última escala de nossa miniturnê, Salvador. Minha viagem particular pelo tempo me levou a um espaço que, se não me engano, se chamava Manatee (quem me salva dessa?), onde abrimos para uma banda de axé da qual, obviamente, não me lembro o nome, que roubada! Desse dia quase nada restou, a não ser a vívida sensação de deslumbramento com a cidade, e com a complexidade humana e cultural que nem tantas visitas foram capazes de desvendar.

Quanto ao show que faríamos, sabia-se que 5 mil ingressos haviam se esgotado em menos de

duas horas, o que nos levou a agendar uma segunda data para atender à surpreendente demanda. Aos que nunca lá estiveram, vale observar que a Concha Acústica está para a música brasileira assim como a Bonboneira está para o futebol Argentino. Trata-se de uma panela de pressão, onde a plateia forma um paredão que se separa do palco apenas por uns dois ou três metros. Disposta como um anfiteatro, a casa permite a peculiar possibilidade de se fazer apresentações de grandes porte sem perder o clima intimista.

Essa característica, submetida ao público soteropolitano, me levou a temer pela viabilidade do show, visto que, na primeira música, cogitei se o equipamento de som daria conta de encobrir o coro de nossos fãs. Era impossível se ouvir! Uma certeza eu tenho: aquilo não foi projetado para um show do Los Hermanos, hehehehe…

Desde que soube que tocaríamos na Concha, alimentei secretamente a expectativa de ver reproduzida aquela belíssima cena do balé de luzes dos celulares em “Sentimental”. Nem precisou pedir. Quem não entendeu a que me refiro, é a cena retratada lá no alto do post. Se ainda restar dúvidas, procure o vídeo dessa música no Youtube. Para dizer em poucas palavras, as duas noites em Salvador foram simplesmente catárticas, com direito a bis, tris, “Pierrot” e tudo mais, tanto que até o Vicente, meu filho, resolveu entrar no palco para agradecer.

Apesar de realmente ter deixado minha câmera fotográfica em casa, o pedido que fiz a vocês foi mais uma desculpa esfarrapada para ganhar tempo e deixar assentar a poeira provocada por essas duas semanas, para que, só então, eu conseguisse escrever alguma coisa sobre elas.

Concordo com ele. Nestes 11 anos desde o lançamento do primeiro disco, tudo que o Los Hermanos fez foi viajar sem parar, de um canto a outro deste enorme país, levando as próprias composições debaixo do braço para ver no que dava. Em tantos lugares pelos quais passamos, o intuito sempre foi o de fazer com que nossas músicas fossem independentes de nós, que chegassem onde não pudéssemos ir, e que ganhassem vida através de vocês.

Estes cinco shows serviram para, mais uma vez, confirmar que atingimos esse objetivo. Obrigado a todos que tornaram esse sonho possível, e que permitiram a esses quatro amigos de faculdade orgulhar-se de uma conquista tão maravilhosa e involuntária quanto inesperada. Independente do que o futuro nos reserve, posso afirmar sem hesitação: eu sei que vocês estão aí. Muito obrigado, de coração, por tudo!


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